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Quando este ano nos vimos forçados a organizar o
habitual Festival Anual dos Prémios Lusófonos da Criatividade num modelo
digital, uma das coisas que pensámos foi que seria interessantíssimo colocarmos
publicitários de língua portuguesa a entrevistarem-se uns aos outros.
Foi
assim que de um momento para o outro colocámos o Hugo Veiga a entrevistar um
dos seus ídolos (palavras do próprio Hugo), o PJ Pereira, e foi também graças a
este modelo que tivemos a honra de ver e ouvir o Edson Athayde a entrevistar o
Washington Olivetto. É sobre esta conversa que vos gostava de falar.
Se
acha que o Olivetto é apenas o melhor publicitário de sempre da história do
Brasil, então não percebe nada de publicidade e muito menos da história do
Brasil. Falar de Washington Olivetto é muito mais do que falar de dois dos
melhores filmes publicitários de sempre, de muitas centenas de prémios em todo
o mundo e do único publicitário sem ascendência anglo-saxónica a figurar no
hall of fame do Clio.
Falar
de Olivetto é falar também de alguém que teve a cara estampada nos selos de
correio do Rio de Janeiro, de uma das poucas personalidades convidadas para
levarem a tocha olímpica em 2016, de um dos grandes impulsionadores da MPB, de
um dos precursores da Democracia Corinthiana lado a lado de nomes como Sócrates
e Casagrande e é falar também de uma das personalidades brasileiras vítimas da
onda de raptos que assolaram o Brasil no início do milénio, tendo estado 3
meses em cativeiro.
Sobre
este última tema, quando presidiu ao primeiro Lisbon Ad Festival, confessou-me
a mim e ao Luís Silva Dias, durante um passeio no Jardim das Amoreiras, que
tinha curado o trauma do rapto precisamente em Lisboa, com uma receita bem
simples: a saborear solitariamente um empadão de perdiz e uma garrafa de Barca
Velha no Gambrinus, seguidos de uma caminhada nocturna até ao Hotel da Lapa,
onde estava alojado, na companhia de um Cohiba. Ainda hoje ele brinca com o
tema e diz que sabe precisamente o tempo que se demora a pé do mítico
restaurante ao mítico hotel, "o tempo de um Siglo II".
Este
perfil do publicitário culto, popstar e simultaneamente errático, boémio e
dandy, foi algo que se perdeu muito antes de eu entrar na publicidade. Durante
algum tempo, ainda foram ficando alguns resquícios, mas cada vez mais são raros
os casos. O gangue da alface bio e do batido de proteína tomou de assalta a
indústria. E sabem que mais? Não tem mal nenhum, o mundo é assim mesmo.
Mas voltando ao que interessa.
Nesta entrevista, o Edson perguntou ao Washington o que é que a publicidade tem
de especial. Ele sorriu e respondeu com Carlos Drummond de Andrade, tem "o
sal da vida". E não é que tem razão? Quando ele disse esta frase recuei
automaticamente no tempo e voltei a ser o miúdo que juntamente com o João Amaral
foi pela primeira vez ao festival de Cannes (e desembarcado do comboio queria
beijar aquele chão). Voltei a ser o miúdo que - também com o João - viajou com
250€ no bolso e nenhuns cabelos brancos na cabeça, até Miami, para participar
na maratona de jovens criativos do Festival iberoamericano de Publicidade.
Voltei aos antigos estúdios do Manuel Faria na moradia do Restelo, anestesiado
por ver aquelas estrelas todas da televisão a fazerem spots de rádio. Voltei às
primeiras filmagens. Voltei ao primeiros tempos em que a Ana e eu começamos a
trazer as grandes estrelas da publicidade mundial a Lisboa. Voltei aos alpes
suíços onde durante três dias maravilhosos de neve e sol tive a oportunidade de
ser jurado lado a lado com alguns dos meus ídolos. Voltei a todos estes sítios
e agora não quero sair daqui.
A publicidade não é muito
diferente de qualquer outra profissão. Dá-nos sempre cabelos brancos e às vezes
algum dinheiro. Dá-nos amigos, estórias e experiências. Mas fruto da sua
intensidade e das suas particularidades, dá-nos um bocadinho mais. Dá-nos a
incrível oportunidade de viajarmos, conhecermos pessoas incríveis, dá-nos
cultura, dá-nos mundo, dá-nos o poder de mudarmos um bocadinho as mentalidades
e o melhor de tudo: de criarmos, e não há nada mais belo do que sentirmos que
fomos capazes de criar algo que ainda ninguém tinha feito. Em suma, dá-nos o
tal "sal da vida", de que Olivetto nos falava. E isso não tem preço.
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