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O que têm em comum o mundo dos negócios, do futebol e das artes? São três áreas em que o género masculino é predominante.
Mas, neste Dia Internacional da Mulher, o Imagens de Marca quis trazer-lhe histórias de três mulheres inspiradoras que estão a traçar o caminho para a igualdade de género.
Luciana Cani é atualmente diretora executiva criativa da AKQA, uma agência publicitária situada em Portland, Oregon, nos Estados Unidos. Quem está familiarizado com o mercado publicitário em Portugal, certamente conhece o nome. No seu currículo, tem 23 anos de experiência, em quatro continentes, em empresas como Saatchi & Saatchi Tokyo, Ogilvy Brasil, ou Leo Burnett em Lisboa, sempre em cargos de liderança.
“Ser mulher é uma vantagem”, começa por contar ao Imagens de Marca. “Eu acho que hoje em dia até é valorizado ter uma mulher num cargo de liderança”. Luciana opta por uma liderança empática, “em que é preciso ter algum tipo de sensibilidade e diplomacia e ser mulher facilita esse tipo de liderança”, explica a empresária.
Mas nem sempre foi assim. Embora a diretora executiva criativa refira que ser mulher lhe permita exercer uma liderança com a qual se identifica, Luciana conta que foi “um caminho das pedras”.
No outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos, terra das oportunidades e do sonho americano, “sempre foi mais fácil para uma mulher ter poder para liderar, para ser bem-sucedida”. O mesmo não acontece no Japão, um país onde, segundo explica Luciana, é ainda muito masculino.
“Era muito comum estar numa reunião em que todos os presentes eram homens, mas eu nunca senti um desrespeito. Senti que ainda é um país que precisa de mudar” – conta Luciana Cani.
Durante a nossa conversa, Luciana partilhou ainda que, uma mulher numa situação semelhante à que se encontrou, “numa reunião em que todos os presentes eram homens”, não se deve sentir intimidada ou questionar o seu lugar. Esse tipo de pensamento só atrasa o processo da igualdade de género e põe, inclusive, em causa o valor profissional das mulheres.
“Eu sentia que eu trazia alguma coisa de novo, não é ser arrogante, é ser segura! Segura do meu percurso. Segura do porque me contrataram e do valor que trago.”
No que toca à desigualdade salarial, uma realidade ainda de muitos setores, Luciana diz que essa diferença já não existe na criatividade, uma vez que foram criadas regras e tabelas salariais dentro das empresas para que tal não aconteça. “São tantos os learnings do passado que eu não vejo isso a acontecer na criatividade. Claro que, quando falamos de atletas, ainda há uma discrepância entre homem e mulher, claro”, acrescenta.
É o caso do mundo do desporto: Jéssica Silva, jogadora de futebol, entra no relvado pelo Benfica e também pela seleção feminina portuguesa desta modalidade. Partilhou com o Imagens de Marca o orgulho que sente ao ir representar Portugal no Mundial de Futebol Feminino de 2023. Praticante de desporto desde pequena, seguiu o coração quando optou pelo futebol, um caminho que seguiu inspirada pelo pai, também ele, fã da modalidade.
Foi na adolescência que Jéssica fez a escolha de vida que a tornou campeã europeia de futebol e que a leva agora a disputar o título no Campeonato do Mundo, mas considera que foi uma decisão relativamente tardia. “Não sabia, nem nunca soube, até aos meus 15 anos, que podia pertencer a uma equipa, ou que as mulheres podiam jogar futebol”.
Isto acontece porque, segundo a internacional portuguesa, as mulheres atletas de futebol ainda não aparecem nas capas de jornais. Apesar de o desconhecimento do futebol feminino ser ainda grande, as mudanças têm-se feito sentir de forma acentuada. Há cada vez mais investimentos na modalidade, quer por parte dos clubes, das ligas e até mesmo das marcas.
Jéssica aponta, no entanto, que apesar dos esforços, os investimentos não estão alinhados. “A comunicação é a chave para a evolução do futebol feminino, mas, ou há boa comunicação e o investimento não é tão grande, ou há investimento e não há aposta na comunicação”, explica.
A atleta salienta ainda que “do ponto de vista social as pessoas não acompanham tanto (o futebol feminino) […] As pessoas olham para o Lyon (em França) como a melhor equipa do mundo, mas não há tanto público porque não há muita cultura do desporto feminino e do futebol feminino, apesar do investimento do clube.”
“Quer na Suécia, quer no Lyon, elas têm as melhores condições. Eu cheguei a estar na Suécia a ter mais público do que quando estava em França. Em Espanha nota-se que há um crescimento incrível. Quando lá estive já conseguia sentir a liga que queria tornar as jogadoras todas profissionais. […] O Barcelona encheu o estádio com noventa mil pessoas já por duas ou três vezes”, conta.
Já nos Estados Unidos, o cenário é o mais promissor. Jéssica partilha que, naquele país, é normal as jogadoras serem mães e levarem os filhos para os estágios quer da seleção, quer dos clubes onde jogam.
A 22 de fevereiro a seleção portuguesa feminina conseguiu, pela primeira vez na História, ser apurada para o Mundial de Futebol. “Isto surpreende muita gente, mas a nós não nos surpreende porque sabemos que isto tem sido um processo”.
“Nós não nos podemos queixar a nível de condições de infraestruturas da Federação Portuguesa de Futebol porque quando vamos à seleção temos um super relvado, dão-nos muitas condições, mas nem todos os clubes dão essas condições às jogadoras. […] É importante que os clubes proporcionem às jogadoras melhores condições para que possam realmente ser profissionais”.
Mas mais do que a falta de oportunidades, o salário atribuído a uma jogadora de futebol está ainda muito abaixo do salário de um jogador masculino.
“Não queremos ganhar como o Cristiano Ronaldo ou como o Bruno Fernandes, não é isso. Eu acho é que temos de ter as mesmas oportunidades, têm de nos dar as mesmas condições para que nós possamos desempenhar a nossa função tão bem como eles”.
O mesmo acontece no mundo das artes. Carolina Piteira descreve-se como uma “contadora de histórias” e uma “pintora da cor”.
“Já na altura da escola tínhamos muitos mais alunos rapazes que se formaram em pintura e que continuaram o percurso em pintura”, conta-nos que gostava que houvesse mais mulheres na área.
“Antigamente as pintoras não tinham reconhecimento e muitas vezes eram elas que faziam o trabalho, mas havia outra pessoa que assinava, elas eram mais vistas como as modelos, as musas inspiradoras que apareciam muitas vezes seminuas ou mesmo nuas”, continua.
Para ser pintora, “tem de se pensar e respirar pintura” e, no meio da azáfama do quotidiano em que são muitas as responsabilidades, “os filhos aparecem” e com eles surge também a difícil conciliação da vida profissional com o novo “papel de mãe”.
“Eu sinto que, felizmente, consegui quebrar essa barreira antes de ser mãe. Ou seja, eu desde muito nova que sempre soube que queria ser pintora e […] por mais angustiantes e assustadores que os dias fossem, eu não ia desistir”, complementa.
Um comentário em particular, relacionado com essa dura conciliação, inspirou-a a criar uma das mais recentes obras que pretende retratar a maternidade.
Num contexto global, Portugal está ainda um pouco atrasado em relação a alguns países. “Eu acabei de vir de Berlim, fui ver umas exposições em trabalho e disseram-me que, só em Berlim, há um milhão de artistas a viver, o que é uma loucura, certo? […] Lá fora toda a gente sabe que é possível viver-se de pintura”.
Por cá, são poucos aqueles que conseguem viver da pintura. Uma área onde é difícil para os homens singrar e onde as mulheres começam também a ganhar terreno. Já no mercado dos leilões, as grandes licitações vão para obras feitas por homens.
“Noventa por cento das pinturas que estão em leilão lá fora, de 200 mil a um milhão de euros, são quase todos os de homens”.
Mas a artista diz ser o reflexo de uma geração que está agora a terminar e que “o gap (fosso, em tradução livre) vai começar a diminuir”.
Apesar de Luciana, Jéssica e Carolina serem mulheres com percursos e testemunhos diferentes, é fácil encontrar o denominador comum nos seus discursos. Todas elas partilham que, embora ainda haja predominância do sexo masculino e de Portugal ser ainda um país com muito caminho pela frente face aos restantes países europeus, essa diferença está a começar a dissipar-se e as mulheres estão, progressivamente, a ocupar cada vez mais lugares de topo.
Não se trata de “uma luta de géneros”, conforme referem, mas sim de uma “caminhada conjunta” com destino a um futuro mais promissor para as gerações futuras.
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