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Escrevo esta crónica enquanto arrumo as memórias do Golden Drum, o festival de publicidade da Europa Central e de Leste que aconteceu em Portoroz de 17 a 19 de Outubro, e que este ano incluiu Espanha e Portugal pela primeira vez. Desconfio que esta abertura foi um caso isolado. Espanha é um mercado forte e regressou da Eslovenia com muitos prémios, “demasiados prémios”, segundo o que transpirava nos corredores do Festival.
O Golden Drum tem 25 anos e é promovido pela Câmara de Publicidade Eslovena, associação que reúne agencias, meios e anunciantes com o objectivo de promover a criatividade na região. Os seus resultados contam para o Gunn Report, o ranking mais importante do mundo que mede a performance criativa das agências, e por isso é um festival onde as multinacionais investem a sério e querem sair bem na fotografia.
Confesso que não sabia nada sobre o Golden Drum quando aceitei o convite para fazer parte do júri, e pouco sabia sobre a Eslovenia. Quando googlei o país, descobri que o único esloveno que conhecia, e mal, era o Slavoj Zizek, o filósofo que ficou famoso no youtube. Também por isso aceitei o convite, para aprender alguma geografia e para observar o valor das fronteiras na publicidade.
Nem a propósito, distribuíram uma revista Archive durante o festival, e nela vem uma longa entrevista com o Zizek. Nessa entrevista, ele fala sobre o que significa pertencer aos Balcãs. Segundo ele, e de acordo com cada país da região, os Balcãs não existem. Cada país está convencido de que os Balcãs é algo que começa no país do lado, nunca no seu. Durante o festival, fui observando como esta vontade de não pertencer aos Balcãs é inversamente proporcional à vontade de pertencer a esta parte da Europa. Seja por alguma mobilidade profissional que existe, pelas agências que exportam trabalho para países vizinhos, ou pela identificação cultural. O sentido de região também se vê no trabalho premiado. Deixo-vos os meus preferidos:
Uma campanha checa para um jornal contra o nazismo, o radicalismo e a guerra:
Uma campanha polaca para a Ben&Jerrys que criou um arco-íris holográfico e indestrutível, como reacção aos ataques homofóbicos em Varsóvia.
Uma campanha para uma revista romena que inventou uma linha de moda regional como reação à apropriação indevida da Dior do design tradicional romeno.
Uma campanha do Montenegro que usou a Eurovisão para protestar contra o aborto selectivo em função do sexo do bebé.
Uma ideia polaca para demonstrar o poder da realidade virtual, criando uma exposição de obras de arte para cegos.
Uma campanha italiana/nova iorquina da Diesel que criou a Deisel, uma marca de contrafacção.
Muitos dos trabalhos premiados reflectem algum contexto da região. Vim para casa a pensar em Portugal. O que diz de nós a nossa publicidade? E a que região pertencemos? À Europa, sem duvida, mas esta não deixa de ser uma região vasta e diversa. Com quem mais, que esteja próximo de nós, nos podemos comparar e unir forças? Se olharmos para o mapa, temos o oceano por um lado e Espanha por outro, e depois temos os países lusófonos com quem partilhamos fronteiras linguísticas. Temos alguma proximidade com o Brasil e com Angola, países para onde exportamos talento, e no caso do Brasil de onde o importamos também, porque a língua facilita muito. Mas venho do Golden Drum com a sensação de que era bom para a criatividade portuguesa pertencer a mais clubes e a mais regiões, a todas as que pudermos. À ibérica, à europeia, à lusófona, até à latina. Era bom juntarmo-nos mais vezes com mercados com quem tenhamos algo em comum, para encontrar semelhanças e diferenças, para aprender, para exportar, e para jogar em relvados de tamanho intermédio. Nenhum mercado é uma ilha, mesmo que o planeta tenha conspirado para nos deixar rodeados de mar por quase todos os lados.
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