O silêncio das marcas

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A opinião de Uriel Oliveira
O silêncio das marcas
27 de Junho de 2025
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Uriel Oliveira
Especialista de comunicação
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Nos últimos anos, assistimos à ascensão das marcas com propósito. Campanhas fortemente posicionadas em torno de causas sociais e ambientais tornaram-se a norma em muitos setores. A Nike, por exemplo, deu palco a Colin Kaepernick — o jogador da NFL que se ajoelhou durante o hino nacional em protesto contra a violência racial nos EUA — colocando-o no centro de uma campanha global que dividiu opiniões mas reforçou a identidade ativista da marca. A Dove defendeu a autoestima das mulheres, e a Ben & Jerry’s usou consistentemente a sua voz para causas como o clima ou a justiça social. Era o tempo do brand activism — e quem se mantinha neutro, era visto como cúmplice do status quo.


Em 2025, com o mundo em alvoroço, o panorama parece ter mudado. O tom das marcas parece cada vez mais neutro, a linguagem mais cuidada, e o posicionamento mais raro. Onde antes havia mensagens mobilizadoras e uma urgência ética, hoje há silêncio — ou, pelo menos, prudência. Será este o fim do ativismo de marca?


A mudança tem várias causas. Desde logo, a crescente polarização política e social transformou o posicionamento num terreno arriscado. Marcas que ousaram assumir causas divisivas sofreram consequências diretas. Nos Estados Unidos, a Bud Light, por exemplo, enfrentou uma quebra abrupta nas vendas após colaborar com a influencer trans Dylan Mulvaney — e viu-se no centro de uma tempestade mediática que levou ao afastamento de executivos. A Disney, por sua vez, envolveu-se num confronto político aberto por ter defendido direitos LGBTQ+ nas suas produções e posicionamentos institucionais. Estes episódios demonstraram que, num clima de fratura cultural, cada palavra pode ser arma ou alvo — e, por vezes, ambas.


Por outro lado, temos talvez o caso mais paradigmático de Elon Musk e a Tesla. A marca, pioneira e disruptiva no setor automóvel, começou a perder força entre consumidores liberais norte-americanos, tradicionalmente sensíveis às causas ambientais. A crescente exposição pública de Musk, marcada por declarações polémicas sobre imigração, identidade de género ou política internacional, tornou-o uma figura altamente polarizadora. Em 2024, analistas associaram a quebra nas vendas da Tesla nos EUA ao desgaste reputacional de Musk. Na Europa em 2025, as vendas da Tesla caíram mais de 40%, em reação à sua aproximação a Donald Trump e a partidos de extrema-direita na Alemanha — provando que nem sempre é a marca que comunica, mas sim quem a representa. Apesar da politização não partir da Tesla, o seu efeito reputacional e financeiro é inegável.


Este recuo no discurso social não se explica apenas pelo medo. Há uma razão económica igualmente forte. A instabilidade global, a pressão inflacionista, os custos crescentes e a exigência de rentabilidade estão a recentrar o marketing na sua função primordial: vender. Um dos exemplos mais claros vem da Unilever, historicamente uma das vozes mais fortes na defesa do propósito empresarial. Com marcas como a Dove ou a Ben & Jerry’s, liderou durante anos o discurso de responsabilidade social no grande consumo. No entanto, em 2024, o novo CEO, anunciou uma revisão estratégica na comunicação, o propósito — afirmou o gestor — deve servir o negócio, não substituí-lo. A prioridade voltou a ser a performance. Várias marcas com forte discurso social, mas com fraca rentabilidade, foram descontinuadas ou reavaliadas. E ficou claro que até os gigantes do marketing estão a repensar o equilíbrio entre impacto e eficácia.


Ainda assim, nem todas as marcas optaram por desaparecer do debate público. Algumas continuam comprometidas com práticas sustentáveis e socialmente responsáveis — mas com uma abordagem menos emocional, mais prática. A IKEA é um bom exemplo. Em vez de campanhas dramáticas ou narrativas emotivas, tem vindo a comunicar de forma discreta o seu investimento em economia circular, energias renováveis, e produtos acessíveis com menor pegada ambiental. O serviço de recompra de móveis usados, por exemplo, está disponível em várias lojas europeias, promovendo uma nova lógica de consumo — sem recorrer a grandes slogans ou discursos ativistas. A sustentabilidade é comunicada com simplicidade, como parte do dia-a-dia do consumidor. É uma forma de ativismo silencioso, mas eficaz.


Tudo isto levanta uma questão essencial: o que querem realmente ouvir os consumidores? Apesar da retração de muitas marcas, os dados mostram que sobretudo as gerações mais jovens continuam a valorizar empresas com valores — mas com condições. Já não basta mudar o logótipo nas redes sociais durante o mês do orgulho. Exige-se coerência, práticas reais, impacto mensurável. O ativismo performativo perdeu tração. O que se valoriza agora é a substância.


Estamos, talvez, a viver uma fase de transição: do marketing com propósito para o marketing com cautela. As marcas falam menos, medem mais e pensam duas vezes antes de tomar posição. Há contudo um risco eminente neste silêncio estratégico: tornar-se invisível. Num mundo onde tudo comunica — das palavras ao silêncio — não dizer nada é também uma forma de dizer. E quando os consumidores procuram referências éticas num mercado ruidoso e complexo, abdicar do posicionamento pode ser um passo em direção à irrelevância.

 

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