O Papa que deixou uma lição para as marcas

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A opinião de José Borralho
O Papa que deixou uma lição para as marcas
30 de Abril de 2025
O Papa que deixou uma lição para as marcas
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O Papa que deixou uma lição para as marcas
José Borralho
Chairman & Inspiration Officer Consumer Choice
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Sou ateu. Não por rebeldia nem por trauma, apenas nunca precisei de um céu para dar sentido à terra. Mas sempre tive um enorme respeito por quem tem fé com consciência, e não por conveniência. E é por isso que a morte do Papa Francisco, este mês de abril, me fez parar. Porque, independentemente da fé de cada um, há líderes que falam mais alto do que as instituições que representam. E Francisco foi um deles.

 

Um comunicador de outro tempo e, paradoxalmente, um exemplo para os tempos de agora.

Num mundo em que o marketing é muitas vezes ruído, fórmula e performance, a figura do Papa é um lembrete desconfortável: a mensagem mais poderosa ainda é aquela que vem com verdade. Sem filtros, sem press releases, sem storytelling ensaiado. E, talvez por isso, o marketing devia estar de luto também. Porque morreu um dos poucos comunicadores globais que conseguiu unir palavras, valores e ações numa só narrativa coerente. Coisa rara nas marcas de hoje.

 

Francisco não vendia nada. Mas inspirava tudo. Não tinha logotipo, mas tinha identidade. Não fazia campanhas, mas movia consciências. E essa é a lição brutal que os profissionais de marketing precisam perceber: enquanto as marcas gritam por atenção, há figuras que sussurram e, mesmo assim, ecoam. Não por serem perfeitas, mas por serem fiéis a algo maior do que a sua própria imagem.

 

A sua comunicação era, no fundo, um ato de serviço. Ele falava com os pobres sem paternalismo, com os poderosos sem medo, com os jovens sem artificialismo. E, acima de tudo, com todos, sem precisar de mudar de tom ou de persona. Havia uma unidade entre aquilo que dizia, aquilo que fazia e aquilo que era. Ora, se isto não é branding autêntico, então o que é?

 

Enquanto o marketing se fragmenta entre departamentos, agências, personas e análises de performance, Francisco mostrava o poder da simplicidade radical. Usava palavras curtas, metáforas humanas e não precisava de buzzwords. Onde as marcas procuram “propósito” como se fosse um KPI, ele encarnava o propósito como ponto de partida, não como tática.

 

E não tinha medo de confrontar a própria estrutura que representava. Quando, em fevereiro de 2017, Francisco fez uma declaração sobre maus cristãos, sugerindo que “é melhor ser ateu do que um dos muitos católicos que levam o que ele chamou de uma vida dupla e hipócrita”, fê-lo sem rodeios. Essa frase diz mais sobre coerência do que mil campanhas de “ética empresarial”. Disse, em voz alta, o que muitos pensam em silêncio: que a reputação só vale quando está alinhada com a prática. Que a verdade incomoda, mas liberta. E que a hipocrisia, em fé ou em marketing, é sempre tóxica.

 

As marcas falam cada vez mais sobre valores. Mas poucos os vivem. E é aí que está o abismo. Francisco não precisava de dizer que era inclusivo, ele simplesmente incluía. Não precisava de dizer que era sustentável, vivia com o mínimo. Não prometia escuta ativa, ouvia mesmo. E esta diferença, que parece subtil, é abismal. Porque no marketing moderno, muitas marcas transformaram os valores em adereços. Em poses. Em campanhas de oportunidade. E esquecem-se de que o público pode até comprar uma mentira uma vez, mas não a respeita duas.

 

Francisco falava com o coração e não com o algoritmo. E isso fazia com que a sua mensagem atravessasse fronteiras ideológicas, religiosas e culturais. Era um comunicador universal, não porque queria agradar a todos, mas porque era coerente consigo mesmo. E essa coerência gera confiança, a moeda mais rara do nosso tempo. Uma confiança que não se compra com tráfego pago, nem se alcança com estratégias de funil. Constrói-se na constância entre o que se diz e o que se faz.

 

Hoje, as marcas gastam milhões a tentar parecer humanas. Investem em tom de voz, em causas sociais, em campanhas com storytelling emocional. Mas esquecem-se de que o mais importante não é parecer humano, é ter humanidade. E isso não se delega a um copywriter, nem se simula num guião de vídeo com atores e música inspiradora. Isso sente-se. Vive-se. E percebe-se à distância.

 

Se, nós, profissionais de marketing quisermos mesmo aprender alguma coisa com o Papa Francisco, deveremos começar por desmontar o culto à performance e reconstruir a base das nossas marcas sobre três pilares que ele personificava como ninguém: verdade, simplicidade e compaixão. Porque só quem comunica com verdade constrói ligação. Só quem simplifica toca o essencial. E só quem tem compaixão entende o outro, não como target, mas como ser humano.

 

Se calhar o problema dos tempos atuais no marketing não seja falta de criatividade, mas excesso de medo. Medo de desagradar. Medo de errar. Medo de perder. E por isso fica-se pelo seguro: pela frase testada, pela tendência copiada, pela campanha que não ofende. Mas ao fazer isso, ofende-se algo maior: a inteligência de quem consome, a emoção de quem procura sentido, e a confiança de quem quer acreditar.

Francisco, com todos os seus limites, foi uma das figuras mais ousadas do nosso tempo. Porque ousava ser vulnerável. E isso, hoje, é revolucionário. Dizia coisas impopulares. Visitava lugares esquecidos. Recusava os privilégios do cargo. E com isso, paradoxalmente, tornava-se mais poderoso. Porque a força de uma marca, como de uma pessoa, não vem do que exibe, mas do que está disposta a perder por aquilo em que acredita.

 

Talvez o marketing precise de menos líderes criativos e mais líderes com alma. Gente disposta a fazer perguntas desconfortáveis: a nossa marca é corajosa? É coerente? É consequente? Ou apenas está a tentar parecer do lado certo da história?

 

A morte do Papa Francisco não é apenas o fim de um ciclo na Igreja. É o fim de uma era rara em que a comunicação institucional teve rosto, voz e coração. E se o marketing quiser continuar a existir como força de impacto positivo e não apenas como ferramenta de persuasão então precisa de olhar para estes raros exemplos com humildade. Porque enquanto as marcas continuarem a priorizar métricas em vez de memórias, alcance em vez de significado, e inovação em vez de intenção… continuarão a ser esquecidas.

O marketing que queremos não é aquele que grita mais alto. É o que fala mais fundo.

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