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Desafiar tudo o que acreditávamos sobre gerações, consumo e comportamento humano.
Durante décadas, tentámos decifrar o ser humano a partir de rótulos geracionais. Como se a idade pudesse explicar sonhos, dores, valores e escolhas. Como se o comportamento humano pudesse ser catalogado por datas de nascimento. Como se o tempo cronológico fosse suficiente para explicar o que sentimos. Boomers, X, Millennials, Z, Alpha… organizámos as pessoas em caixas, como produtos em prateleiras. Acreditámos que quem nasceu antes vivia num mundo emocional completamente distinto de quem nasceu depois. Que cada geração era um capítulo isolado da história. Parecia lógico. Parecia útil. Era uma forma de reduzir o caos: classificar para prever, rotular para controlar.
Hoje, parece simplesmente curto demais. Estávamos errados.
Não o digo como académico distante. Digo como alguém que viveu, observou e trabalhou com todas estas gerações, que viu avós mais digitais do que os netos e jovens mais cansados da vida do que quem já viveu meio século. Ao longo dos anos tenho trabalhado com marcas, equipas e consumidores de todas as idades. Em empresas, em estudos de mercado, em projetos com pessoas muito diferentes entre si. E há uma verdade que se torna cada vez mais clara: a data de nascimento deixou de ser o que define o comportamento humano. Hoje, o que nos define é a emoção em que vivemos.
Um jovem de 20 pode estar exausto da vida, sem energia e sem sonho. Um adulto de 50 pode estar a renascer, a mudar de carreira, a descobrir uma nova versão de si. Uma mãe e um filho partilham a mesma ansiedade digital, a mesma overdose de informação, a mesma necessidade urgente de sentido. Não vivemos em gerações separadas. Vivemos na mesma tempestade emocional. Podemos ter idades diferentes, mas estamos mergulhados no mesmo ruído, nas mesmas dúvidas, na mesma pressão para ser mais, fazer mais, mostrar mais.
E quanto mais observo, mais acredito que cometemos um erro gigantesco: tentámos compreender pessoas pela cronologia, quando devíamos tê-las compreendido pela emoção. O mundo mudou demasiado depressa para continuarmos a dividi-lo por décadas. O tempo tornou-se líquido. A transformação tornou-se diária. As fronteiras entre gerações desmancharam-se na prática, mesmo que continuem a ser repetidas em apresentações e relatórios. Hoje, o X, o Y e o Z já não explicam ninguém. Tornaram-se fósseis conceptuais, confortáveis para análise, inúteis para a realidade.
Não existe hoje uma sociedade verdadeiramente dividida por gerações. Existe uma sociedade unida por emoções. A data de nascimento deixou de ser critério relevante para compreender decisões, expectativas e comportamentos. O que nos agrupa hoje são frequências emocionais: estados de exaustão, entusiasmo, medo, pertença, frustração, esperança. Podemos ter 18, 40 ou 65 anos e estar no mesmo lugar emocional: cansados da velocidade, saturados de informação, ávidos de significado. É essa constatação que está na
origem do conceito que desenvolvi e a que chamo E Society: a primeira sociedade da história definida não pela idade, mas pela emoção.
E o E não é uma letra. É um código emocional. Um novo mapa para compreender quem somos e como escolhemos. Quando falo em E Society, não estou a falar de uma nova buzzword, mas de um modelo simples para descrever aquilo que, na prática, já está a acontecer.
O E é de Energia. A energia é a vibração emocional que conecta pessoas, marcas, mensagens e histórias. É aquilo que sentimos quando algo faz sentido antes de o conseguirmos explicar. Quando olhamos para uma campanha, para um produto ou para uma experiência e pensamos “isto é comigo”. Essa identificação não nasce da idade, nasce da energia emocional que reconhecemos ali.
O E é de Escolha. Cada escolha é um acto emocional, ainda que a justificação apareça depois, em linguagem racional. Escolhemos o que nos representa, não apenas o que nos serve. Podemos argumentar com preço, funcionalidade ou características técnicas, mas o que verdadeiramente nos move é: “Isto diz algo sobre quem eu sou?” ou “Isto faz-me sentir melhor comigo?”. O coração antecede sempre a razão. A intenção é formulada muitas vezes em discurso racional; a decisão real acontece num nível emocional.
O E é de Experiência. O produto é apenas o veículo. O que fica é o arrepio, a memória, a sensação. Já não é suficiente que algo “funcione”; tem de fazer sentir. Um restaurante é mais do que comida, é o ambiente, o serviço, o tempo que passámos lá. Um telemóvel é mais do que um dispositivo, é a sensação de pertença, a forma como nos ligamos aos outros e ao mundo. Um evento de marca é mais do que um conjunto de atividades, é o sentimento com que saímos. A experiência é o contexto emocional que dá significado ao consumo.
O E é de Empatia. A empatia é o fio invisível que transforma audiência em comunidade. Quando alguém sente “eu também”, deixa de ser apenas espectador e passa a sentir-se parte. Não é a marca a falar “para” uma massa anónima; é a marca a falar “com” alguém específico. A empatia não é um truque simpático, é a base da relevância. Não se trata de agradar; trata-se de reconhecer a humanidade do outro.
O E é de Essência. Depois do excesso, o regresso. Menos pose, mais verdade. Essência é aquilo que permanece quando retiramos o ruído, os adornos e as frases vazias. É o valor real por trás da narrativa. Numa época em que tudo pode ser encenado, a essência é o critério mais precioso. As pessoas começam a distinguir o discurso da substância. E quando percebem que não há essência, afastam-se.
O E é de Emoção. A emoção não é um detalhe que influencia a escolha; é a própria escolha. Estudos mostram há muitos anos que a maioria das decisões humanas é emocional, mas durante demasiado tempo o marketing tratou este facto como curiosidade de rodapé, não como ponto de partida. A decisão acontece primeiro numa resposta emocional. A argumentação racional vem depois, para justificar aquilo que já decidimos sentir.
O E é de Evolução. Evolução aqui não é apenas tecnológica; é emocional. Saímos de um marketing que tentava manipular atenção, para um marketing que, quando bem feito, pode verdadeiramente mudar
vidas e comportamentos. Do “ter” para o “ser”. De campanhas pensadas para empurrar produtos, para experiências pensadas para criar significado e impacto real na vida das pessoas.
É neste contexto que faz sentido olhar de frente para o mundo em que vivemos. Vivemos na era do scroll eterno, da dopamina barata, da notificação compulsiva. Tudo disputa um segundo do nosso cérebro. O conteúdo é infinito, a atenção é limitada, o tempo é escasso. Mas nenhuma notificação, por si só, preenche o vazio do propósito. As pessoas estão cheias de prazer rápido e famintas de significado. Estão sobrecarregadas de informação e carentes de emoção com profundidade. Querem menos ruído e mais clareza. Menos conteúdo e mais conexão.
E isso vê-se nas pequenas revoluções emocionais do dia a dia. Quando uma banana num supermercado traz a frase “Leve-me consigo”, não estamos apenas a comprar fruta; estamos a comprar empatia, humor, proximidade. Aquilo funciona porque reconhecemos ali um gesto emocional simples: “eu sei que é indiferente qual banana levas, então ajudo-te a sorrir e a decidir”. Quando discutimos uma tampa de Coca-Cola, não estamos a debater apenas plástico; estamos a mexer na memória afetiva de anos de consumo, no som, no gesto, no ritual que associámos a essa marca. Quando choramos a ver um anúncio da Vodafone, não estamos apenas a ver publicidade; estamos a ver uma parte da nossa própria experiência refletida numa história.
O cérebro decide com emoção e justifica com lógica. É simples e, ao mesmo tempo, profundamente difícil de aceitar para quem sempre construiu estratégias com base em argumentos racionais. Mas a verdade é direta: quem comunica com a cabeça, perde; quem comunica com o coração, converte. Não porque a razão não importe, mas porque a razão entra tarde. A intenção vive na mente. A ação vive no coração.
É por isso que dizemos que queremos sustentabilidade, mas escolhemos conveniência. Dizemos que queremos apoiar causas, mas clicamos no que é mais rápido. Dizemos que queremos menos plástico, mas irritamo-nos com a tampa presa. Não somos hipócritas por natureza; somos emocionais por estrutura. E as marcas continuam, muitas vezes, a comunicar para a intenção racional, quando deviam comunicar para a ação emocional. Falam de características quando deviam falar de impacto. Falam de diferenciação técnica quando deviam falar de relevância humana.
Ao mesmo tempo, o excesso tornou-se exaustão. Nunca tivemos tanta escolha. Nunca estivemos tão cansados de escolher. Linhas inteiras de produtos que parecem variáveis do mesmo, águas diferentes a fazer exatamente o mesmo, rótulos carregados de claims técnicos que poucas pessoas conseguem decifrar. A liberdade transformou-se em fadiga. A fadiga matou o impulso de compra. O consumidor não diz isto em voz alta, mas grita em silêncio: “Não me dês mais opções. Dá-me sentido.”
É aqui que a E Society se torna mais do que um conceito e passa a ser uma realidade prática. Esta sociedade não quer ser convencida; quer ser comovida. Não quer ver marcas; quer sentir verdades. Não quer apenas comprar; quer que aquilo que escolhe faça sentido na sua história pessoal. Quando algo faz
sentido, a intenção transforma-se naturalmente em ação. Não é preciso empurrar tanto. É preciso alinhar melhor.
O futuro pertence às marcas, líderes e criadores que entenderem esta mudança simples e brutal: quem não emociona, não existe; quem não toca, não transforma; quem não sente, não escolhe. A E Society já chegou e não vai esperar por quem insiste em olhar para trás, preso a mapas antigos para realidades que já não existem. Continuar a segmentar o mundo apenas por idade é ignorar a forma como as pessoas realmente vivem, sofrem, escolhem e mudam hoje.
O que proponho com a E Society não é uma nova moda conceptual, mas uma mudança de foco: sair da obsessão pela cronologia e entrar na compreensão verdadeira da emoção. Significa reconhecer que um jovem, um adulto e um sénior podem partilhar exatamente a mesma necessidade emocional, e é aí que está a chave da relevância. Significa aceitar que, num mundo saturado de estímulos, o único diferencial sustentável é a capacidade de gerar significado. E significa entender que tudo muda quando algo nos emociona de verdade. É aí que a escolha deixa de ser um esforço e passa a ser uma consequência.
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