Conheci o Carlos Morais há mais de 20 anos, por razões profissionais, e dele me tornei amigo e admirador…..

Proprietário do Jornal do Mundo Português, fundado pelo seu pai e pelo Pe. Vitor Milícias, foi o grande criador e impulsionador da maior (e todos os anos cada vez maior) feira anual de alimentação e bebidas de marcas portuguesas, o SISAB.

Quando há cerca de um mês ele morreu num acidente de viação, e ainda não refeito do embate da notícia, o que me vinha à mente continuamente era que ele morreu como vivia, “como um furacão que por onde passava deixava marcas”.

Ainda recentemente, numa altura em que ele estava entusiasmadíssimo, de forma contagiante, com uma dieta que tinha lido num livro comprado num aeroporto, e que estava a fazer à base de vegetais e com a qual já tinha emagrecido não sei quanto kilos... contente com mais este sucesso, partilhou e confidenciou-me de forma emocionada, o seu percurso de vida e os seus projectos... Ele tinha orgulho na obra que fez e nas dificuldades que sempre superou com determinação e vontade. Sugeri-lhe que escrevesse um livro com a sua história, o que seria um bom legado para os seus filhos e um bom testemunho para todos, de que quando se quer e se luta, alcança-se!

O Carlos Morais foi o primeiro português a perceber a relevância dos emigrantes portugueses da década de 50, 60 e 70 do século passado, por essa Europa fora, nomeadamente em França, na Suíça, no Luxemburgo, na Alemanha e no Reino Unido, a par dos EUA e do Canadá, emigração essa com antecedentes mais antigos, para a exportação e promoção das marcas portuguesas de alimentação e bebidas, levando-lhes “um bocadinho da maneira de viver e de consumir na sua terra natal…”.

Destacavam-se nessas comunidades emigrantes que lançaram negócios de importação de produtos tradicionais consumidos em Portugal, o bacalhau, o azeite,o vinho,as cervejas, os refrigerantes, o café, as conservas etc... Designava-se esse mercado como “mercado da saudade”.

A visão do Carlos Morais foi tal, que organizou em 1995 o primeiro SISAB, convidando os emigrantes ligados ao negócio de restauração e bebidas por essa Europa, EUA e Canadá a virem a Portugal, para um encontro com empresas e marcas portuguesas que desejavam exportar para as comunidades de emigrantes aí localizadas... Conto um detalhe que é muito relevante e que demonstra o arrojo e a consideração genuína que o Carlos Morais tinha por esses empresários, e que consistiu em oferecer-lhes alojamento, durante este certame, no melhor hotel de Lisboa - o Hotel Ritz -, fazendo ainda parte do programa, uma noite de gala no Casino do Estoril. Imaginem qual a surpresa destes, na época, na sua grande maioria emigrantes da primeira geração, de origem humilde e rural e que tiveram de emigrar para procurar melhor vida, de regressar ao país e serem recebidos e alojados nos melhores locais…. por alguém que os tratou e os reconheceu como verdadeiros Embaixadores do Mundo Português!

O SISAB foi evoluindo ao longo dos anos, passou do “mercado da saudade” para o “mercado da diáspora”, do “mercado da diáspora” para o “mercado da Língua Portuguesa” e deste para o “mercado global”, com enfoque nos Portuguese Freaks, e de forma mais alargada a outros sectores de negócio que não só os da alimentação e restauração, embora estes continuassem a ser o “core”.

Sei que o Carlos Morais travou algumas lutas com organismos públicos, com cash & carries e com marcas internacionais que queriam estar no SISAB, bem como rejeitou ofertas atraentes de compra da iniciativa SISAB, mantendo-se fiel ao seu projecto - em que acreditava genuinamente e pelo qual era apaixonado. Apesar da sua posição frontal, que sempre assumiu, sobre a forma como se deveria potenciar o relacionamento com os emigrantes, em todas as edições do SISAB, marcavam presença as mais altas individualidades do Estado, do Governo e da Oposição.

Como disse Vasco Avillez na sua qualidade de diácono, na homília da missa de corpo presente do Carlos Morais “o Carlos já está no céu a organizar um evento e a pôr todos a falar e a mexer”.

Carlos, “chapeau”!